Texto: Fátima Ferreira - Fotos: Jerry Correia
Na região do médio rio Ucayali, no Peru, habitavam vários grupos
da família lingüística Pano. Lá estavam os Xixinawá (gente do quati), Kununawá
(gente da orelha-de-pau), Sharanawá, Yawanawá (gente do queixada), Mastanawá
(gente do socado), Bashonawa (gente da mucura), Sharanawá (gente povo bom) e
Yawanawá (gente do queixada). Esses grupos, que eram conhecidos como grandes
guerreiros, realizavam expedições para guerrearem entre si e com outros grupos
da região.

Com a chegada dos caucheiros peruanos tiveram o primeiro contato
com a sociedade branca, obrigando a formarem um só grupo com a denominação de
Jaminawá, e assim dificultando ou mesmo em alguns momentos tornando impossível
a convivência, pois as diferenças eram grandes, deixando uma característica marcante
que é a divergência interna. Com a circulação de ferramentas de metal, as redes
interétnicas de intercambio e a provável disseminação de vírus como o da
varíola, provocando epidemias, levaram à morte inúmeras pessoas e até mesmo
povos.
Com toda essa pressão o povo Jaminawá foi empurrado para o Juruá,
alguns se engajando nas atividades de caucheiro e outros fugindo do contato,
onde mais tarde realizaram uma enorme migração para o Moa (o não afluente do
Juruá), mas um outro menor, do rio Yaco e outra entre os rios Yaco, Purus e
Tahuamanu.
De lá um grupo de mais de cem Jaminawá debilitados por repetidas
epidemias se instala no seringal Petrópolis. Informes da FUNAI descrevem uma
situação de desorganização do grupo e exploração econômica. É estabelecido nesse
ano um posto indígena, quebrando o monopólio do seringal. Com esse apoio, os
Jaminawá se instalam rio acima, na área Mamoadate, que congrega duas aldeias
Jaminawá (Betel e Jatobá) e uma Manchineri (Extrema).

Primeiramente recrutados para trabalhar em seringais sob domínio
do patrão Estevão Meirelles, e mais tarde tornando-se caçadores para o comércio
de pele de animais silvestres, já com o patrão Cariolano. Trabalharam ainda de
mateiros florestais, servindo aos patrões nas aberturas de estradas de seringa
e varadouros de escoamento de produtos e também como extratores de seringa e
caucho. Sempre mantiveram a agricultura de subsistência, servindo até de
mão-de-obra nos grandes roçados dos patrões. Exerciam também a função de
remadores e varejadores nos barcos dos senhores dos barracões.
Anos depois mudaram para o seringal Senegal, de onde saíram para a
cabeceira do rio Acre, onde já se encontrava morando um grupo de Jaminawá, na
época liderado por José Correia, formando a aldeia Ananaia, que se tornou a
principal daquela terra indígena.
Essa perambulação deixa claro uma característica marcante desse
povo, que é o seminomadismo, revelado nas freqüentes mudanças, e as dispersões
de famílias, quase sempre motivadas pelas divergências internas.
No verão, época das praias, costumam realizar passeios para
visitarem seus parentes distantes, sem pressa de retornar. Conta-se também o
fator cultural, quando da morte de um membro da família nuclear mudam-se a fim
de afastar as lembranças do falecido.
A liderança antigamente era um grande caçador, provedor incomum,
que tinha o dom da oratória, mantinha várias mulheres, além de ter o poder da
persuasão na comunidade, mediando conflitos internos e externos e não temendo
forças ocultas. Para isso conhecia as regras de sua tradição. Também não temia
tomar o shori (ayahuaska), que para eles é um remédio. Acreditam que tomar
shori traz saúde ao corpo, mas podem também aplicar o bagaço do cipó sob as
partes doentes do corpo. O shori também tem um lado lúdico, que permite ver ou
viajar. Essas sessões são organizadas pelo koshuit (pajé), uma espécie de
doutor, que detém o poder sobre a vida.
A economia é baseada principalmente no cultivo da macaxeira e
banana, na caça e na pesca. Cada família nuclear possui seu roçado, se tornando
economicamente autônoma, mas não exclui relações de reciprocidade entre as
unidades familiares, pois a carne e o peixe são distribuídos para toda a
comunidade.
A cultura material passa por uma revitalização, onde a cerâmica, a
tecelagem e a cestaria têm sido os artesanatos mais enfatizados. A arte oral e
musical Jaminawá é muito rica, com belos cantos xamânicos conhecidos por
poucos. Homens e mulheres têm seus cantos, que descrevem os sentimentos do
autor e as peripécias de sua vida.
Desde de 1990, o povo Jaminawá vem passando por um estado de
crise. Um fator complexo de difícil explicação até mesmo para os próprios
Jaminawá, resultando na vinda de famílias inteiras para as periferias das
cidades, principalmente da capital. A realidade da cidade logo se apresenta
como uma competição diária para garantir a sobrevivência, fazendo com que
passem a viver um tempo diferente e difícil.
Atualmente rumam em direção a uma reestruturação social, política
e cultural, processo desencadeado pela necessidade de fazer uma reflexão sobre
sua situação. Na assembléia realizada em meados no ano de 2001, reuniram-se
todas as comunidades Jaminawá, resultando na criação da Organização das
Comunidades Agro-Extrativistas Jaminawá (OCAEJ).