sábado, 7 de março de 2020

Do seringal à sala de aula: conheça a história da professora Edilea

Professora Edilea.

Poucas famílias habitavam a sede do Seringal Paraguaçu. Algumas casas cobertas de palha, um pequeno boteco e o grande barracão, símbolo de poder e prosperidade dos seringalistas. 

Paraguaçu já havia ganhado o título de vila. A escola Simon Bolívar oferecia estudo até a 3ª série primária. Tudo funcionava em torno do barracão, erguido em frente ao marco divisório da fronteira entre Brasil e Bolívia, fixado no local pelo Marechal Cândido Rondon em 1929. 


João Furtuoso de Melo era dono de uma pequena taberna em sociedade com o senhor Vicente Bessa. Este último também era comprador de borracha e tempos depois veio a ser o primeiro prefeito de Assis Brasil, cidade que nasceu do Seringal Paraguaçu. 


Casado com Maria Melo de Araújo, João Furtuoso gerou seis filhos, sendo três mulheres e três homens. A primeira das três meninas foi batizada com o nome de Edilea Furtuoso dos Santos. Ela nasceu no dia 13 de junho de 1950, exatamente na Praia do Cigano, próximo à sede do Seringal Paraguaçu. 



Ainda com três filhas pequenas para criar, dona Maria Melo foi abandonada por João Furtuoso. Passou a morar em uma pequena casinha de palha e enfrentar dificuldades para sustentar a família. Tempos depois, casou-se com João Rodrigues de Araújo que era o guarda livro do barracão. 



Dona Maria conseguiu uma vaga para sua filha Edilea estudar na escola Simon Bolívar. Suas professoras foram Astrogilda Bonfim Bezerra e Tereza Cristina, com as quais conseguiu ser alfabetizada e concluir a 3ª série primária. 



O tempo passou e Edilea, agora com 16 anos, casou-se com o seringueiro Arnóbio Gadelha Filho. O jovem casal teve que ir morar em um seringal arrendado pelo pai de Arnóbio, localizado próximo à cidade de Ibéria, no Peru. Ali tiveram três filhas, mas perderam a primogênita que faleceu logo após o parto. 

Depois de sete anos morando em terras estrangeiras, a família retornou ao Brasil e conseguiu comprar uma pequena propriedade rural no município de Brasiléia. Naquela comunidade, Edilea foi convidada a lecionar nas primeiras séries do ensino fundamental, tornando-se a primeira professora da escola rural Ernesto de Abreu. No primeiro ano como professora não recebeu nenhum mês de salário. Mesmo assim, permaneceu por sete anos trabalhando naquela localidade. Durante esse tempo, Edilea ia para a cidade no período das férias e assim conseguiu concluir o Segundo Grau Magistério.

Formatura 2º Grau Magistério
Em 1979 a família passou a morar na zona urbana do município de Brasiléia, ocasião em que o casal foi agraciado com o nascimento da filha caçula. A professora Edilea foi convidada a trabalhar na escola IOP onde foi destaque na alfabetização de crianças. Logo o bom trabalho lhe rendeu um contrato como professora efetiva do Estado do Acre. 

No ano de 1985, Edilea, seu esposo e suas filhas decidiram retornar ao município de Assis Brasil. Na cidade foi ministrar aulas na escola estadual Íris Célia Cabenellas Zannini. Também foi professora na escola Simon Bolívar onde alfabetizou centenas de crianças.

Turma de alunos da escola Íris Célia.

Durante oito anos exerceu o cargo de vice diretora da escola Íris Célia Cabanellas Zannini. Foi ainda coordenadora substituta do Núcleo Estadual de Educação. Aposentou-se de suas funções no ano de 2005. 

Batizada, crismada e casada na Igreja Católica, Edilea sempre foi uma mulher religiosa e faz parte da membresia da Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro.

Considerada uma das pioneiras da educação em Assis Brasil, professora Edilea continua morando na rua Valério Magalhães, bem próximo onde um dia foi o barracão do Seringal Paraguaçu. É avó de quatro netos, três bisnetos e mãe de três filhas, uma delas, Eliane Gadelha, que além de professora também foi a primeira mulher eleita prefeita de Assis Brasil.

Professora durante apresentação teatral.

Aos 69 anos de idade, professora Edilea se orgulha de ter contribuído para a educação de centenas de crianças e jovens. É, sem dúvida, uma ilustre moradora que foi testemunha ocular da história do município de Assis Brasil.





Edilea nos dias atuais.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Chaga Paulino: 100 anos de história


Francisco Chagas Velozo nasceu no município de Assis Brasil, Estado do Acre, no dia 20 de março de 1920, apenas dois anos após o fim da Primeira Guerra Mundial. Filho de dona Francisca Rosa e do senhor Manoel Bandeira viveu boa parte de sua vida no Seringal São Pedro. Foi ali que aprendeu o ofício de seringueiro com apenas 12 anos de idade. E foi um dos melhores da época, premiado pelo patrão com uma espingarda nova por ter produzido mais de mil quilos de borracha em apenas um ano.

Nessa época Assis Brasil ainda era o Seringal Paraguaçu e estava bem longe de ser elevado à categoria de município, o que aconteceu somente em 14 de maio de 1976 através da Lei Estadual 588. Nosso personagem foi testemunha ocular de toda a história política e administrativa do município de Assis Brasil, desde quando era seringal até os dias de hoje.

Seu Chaga Paulino, como é conhecido em Assis Brasil, foi um dos desbravadores da famosa colocação Pedreira onde viveu grande parte da sua vida. Fazia de tudo um pouco. Foi serrador, quando nem se ouvia falar de motosserra, apenas as antigas serras manuais que exigiam perícia e muita força nos braços. Trabalhou também na coleta de castanha em território boliviano. Em uma ocasião, quando coletava os ouriços de castanha na floresta, foi picado por uma cobra venenosa. Sua reação foi de indiferença e não procurou nenhum tratamento para combater o veneno. Não precisa nem dizer o que aconteceu, já que ele está hoje nos contando a história.

Chaga Paulino também foi barqueiro e viajou muito pelas águas do Rio Acre. O detalhe é que naquela época quase não existia motor de rabeta para navegação. Então, tudo era feito na força bruta mesmo, usando remo ou “varejão” para empurrar a canoa rio acima, rio abaixo. 


Por duas vezes, seu Chaga Paulino navegou de Assis Brasil até o município de Xapuri. Isso sem ajuda de motor, somente com a força dos braços. Quero é ver homem hoje pra fazer uma proeza dessa. 

Chaga Paulino também era “bom de pernas”. Já caminhou várias vezes de Assis Brasil até o município de Brasiléia. Isso bem antes de existir estrada, somente varadouros que ligavam um seringal a outro.

Hoje, com um século de vida, seu Chaga Paulino continua morando em Assis Brasil na companhia de uma sobrinha. Por opção, nunca quis saber de casamento e também não gerou filhos. Sua família, no entanto, é bem numerosa e uma das mais tradicionais de Assis Brasil.

Sua atividade preferida é manusear sua velha enxada para limpar os arredores da casa e as laterais da rua onde mora. Esse é o ritual que ele faz todos os dias com muito prazer e alegria. E quando não o faz, por conta daqueles dias chuvosos, fica até zangado.


A biografia desse ilustre morador de Assis Brasil ocuparia muitas páginas de um livro. Registramos aqui um pouco da sua trajetória que merece ser contada para as futuras gerações.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

José Gustavo: a história do comerciante mais antigo de Assis Brasil



Aos 17 anos de idade, o jovem José Gustavo Sales arruma sua mala e se despede do seu velho pai. A mãe já falecida seria contra a decisão do rapaz de sair de seu ninho com destino a um lugar desconhecido. Nem a dor no peito ou as lágrimas nos olhos o fazem desistir do objetivo que fora traçado. Ele está certo que precisa deixar seu lugar, sua gente e suas raízes para tentar a sorte por outras bandas.

De cima do pau de arara ele contempla o que vai ficando para trás. A casinha humilde onde viveu parte de sua vida com a família, os amigos e conhecidos da pequena cidade chamada Meruoca no estado do Ceará.

Agora o garoto estava sob os cuidados de um homem desconhecido responsável por levar trabalhadores do nordeste brasileiro para a região amazônica. Fato comum naquela época em que grande contingente de nordestinos fugia da fome e da seca que castigavam aquele pedaço do Brasil.

O destino do rapaz foi o estado do Acre, mais precisamente na região do Rio Envira onde teve que aprender o ofício de seringueiro. Naquela região teve seu primeiro contato com os segredos e perigos da floresta amazônica. Foi ali também que conheceu uma linda jovem chamada Maria Matias que seria sua companheira por toda a vida e mãe de seus sete filhos.

José Gustavo decidiu sair do lugar onde estava e partir para outra região do estado. Mudou-se com sua família para outro seringal na região do Rio Purus, município de Sena Madureira. Ali trabalhou por anos na tentativa de juntar algum dinheiro para comprar seu próprio lugar. Mas, isso era praticamente impossível, pois as condições impostas pelos seringalistas eram de total exploração.

Mais uma vez foi obrigado a procurar outro lugar para viver. Agora viaja com sua família subindo o Rio Iaco na direção do famoso Seringal Petrópolis. Ali se estabelece em uma colocação onde começa a explorar as seringueiras espalhadas pela imensidão da floresta amazônica.

O Seringal Petrópolis era também uma grande fazenda com milhares de cabeças de gado. O lugar era muito afamado e já tinha uma pequena vila com algumas dezenas de famílias. Mas toda essa prosperidade não alcançou José Gustavo e sua família que sofreram muito enquanto viveram naquele lugar.

A exploração e as precárias condições de vida fizeram com que José Gustavo deixasse o Seringal Petrópolis. Agora ele e sua família conseguem uma colocação no Seringal São Francisco, no município de Assis Brasil. Ali trabalha por alguns anos e ganha experiência nos negócios que envolviam o mercado da borracha.

Decidido a não ser mais explorado por patrão, José Gustavo consegue arrendar o Seringal São Miguel, localizado às margens do Rio Acre nas proximidades do município Assis Brasil. Com essa oportunidade, o agora seringalista, consegue fazer bons negócios e juntar algum recurso para iniciar uma nova etapa em sua vida.

No ano de 1978, muda-se para a cidade de Assis Brasil com toda sua família. Consegue um ponto comercial no mercado da cidade onde começa a vender roupas e tecidos. Foi aí que descobriu sua verdadeira paixão pelo pequeno comércio varejista.

Os negócios prosperam e José Gustavo agora consegue comprar um ponto comercial ao lado do mercado onde trabalhava. O lugar fora vendido na época pelo senhor Vicente Bessa, grande seringalista e primeiro prefeito do município de Assis Brasil.

O tempo passou e o senhor José Gustavo tornou-se um dos principais comerciantes da cidade.  Hoje, aos 90 anos de idade, acredite, ele ainda está atrás de um balcão atendendo seus clientes todos os dias. E isso ele faz por puro prazer, já que aquele pequeno ponto que comprou e onde trabalhou por anos, hoje é um próspero mercado administrado por um de seus filhos. Mesmo assim, seu José Gustavo resolveu montar uma pequena venda colada ao mercado da família só pelo prazer de trabalhar naquilo que gosta.

Com toda essa idade, José Gustavo continua acordando bem cedo para abrir as portas de sua loja. O lucro que busca todos os dias é receber os amigos, vender um geladinho para uma criança que sai sorrindo e continuar servindo o povo de Assis Brasil, assim como fez ao longo desses mais de 40 anos.

O senhor José Gustavo ainda tem um sonho. Ele diz que pede a Deus todos os dias que permita ele trabalhar até os 100 anos. Quer seguir o destino de seu avô que trabalhou até essa idade com muita alegria.

O futuro a Deus pertence. Mas se depender do senhor José Gustavo seu comércio continuará de portas abertas por muitos anos. O que não falta é disposição, felicidade e prazer de viver.


(Jerry Correia)

quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

O fundamental e o essencial da vida



Primeiro dia de um novo ano chamado 2019. Momento de fazer planos, traçar metas e renovar promessas que ficaram pelo caminho. É também aquele dia que olhamos para trás e enxergamos todas as conquistas alcançadas no ano que findou. Assim como, mesmo que em menor intensidade, também avaliamos as derrotas, as frustrações e decepções da vida.

É neste primeiro dia do ano que colocamos na balança da vida o que consideramos vitórias e derrotas. Mas, será mesmo que estamos corretos em nossos conceitos? O que de fato é importante para consideramos como grandes conquistas? O que é fundamental e o que é essencial na vida?

Talvez neste primeiro dia do ano tem alguém decepcionado por não ter conquistado o carro novo em 2018. Ou quem sabe aquela tão sonhada reforma da casa, ou a compra de um novo imóvel para o aconchego da família. Quem sabe tem gente triste porque seu candidato não ganhou as eleições do ano passado. Outros porque não viajaram para curtir a virada do ano em alguma praia paradisíaca. Acredite, tem pessoas muito frustradas por não estarem entre os 52 sortudos que ganharam na mega da virada. Tudo bem, vamos ser honesto. Todos nós vivemos e trabalhamos para realizar sonhos como alguns destes que foram citados. Mas, talvez a pergunta que pede resposta neste primeiro dia do ano seja: o que é fundamental e o que realmente é essencial na minha vida?

Uma pergunta totalmente subjetiva, já que o importante para um pode ser desprezível para outro. Contudo, cabe a reflexão sobre as coisas que realmente importam em nossas vidas e nos impulsionam a conquistá-las ou mantê-las.

Esta pergunta me confronta desde ontem algumas horas antes da virada do ano. Estava na igreja com minha família e comecei a observar os detalhes em meio às pessoas que estavam ali cultuando e esperando a chegada de um novo ano. Gente de todas as idades, de diferentes posições sociais e credo religioso. Mas em meio a tanta gente, uma pessoa em especial me chamou a atenção. Um senhor de aproximadamente 60 anos, casado, pai e avô. O seu nome é Demétrio do Espírito Santo, morador da zona rural de Assis Brasil em uma pacata propriedade distante algumas dezenas de quilômetros da cidade. Este senhor, para mim, era de longe a pessoa mais alegre entre todos que ali estavam. Sua felicidade era contagiante, seu abraço verdadeiro e suas lágrimas traziam para fora a pureza escondida dentro daquele coração.

Conheço o senhor Demétrio há três anos. Ele não tem emprego, não é aposentado, sua esposa da mesma maneira não possui renda alguma. Os dois já estão com idade avançada para o trabalho pesado da lavoura. Sobrevivem daquilo que ainda conseguem plantar e colher. Moram em uma casinha onde não chega carro, onde não tem energia elétrica e nenhum tipo de assistência médica. Eles não possuem carro, moto ou bicicleta. Precisam caminhar dezenas de quilômetros para chegar até a beira da estrada de onde esperam por uma carona.

Esse casal era o mais feliz na festa de ontem. Digo casal, pois, pra ser justo, tenho que incluir dona Fátima, esposa do senhor Demétrio, nesta narrativa. Mas o contraditório é que eles tinham tudo para reclamar do ano de 2018, pelo menos na visão da maioria das pessoas. Pelo contrário, eles estavam alegres e isso era evidente. Mas, por quê?

Seu Demétrio e dona Fátima possuem duas coisas essenciais em nossas vidas: fé e gratidão. Pela fé eles conseguem enfrentar todos os obstáculos e ainda são gratos por aquilo que muitos estão desprezando: amigos, saúde, família e outras dádivas que Deus nos dá todos os dias, e de graça.

O escritor Mario Sérgio Cortella disse certa vez que “as pessoas estão começando a fazer uma distinção necessária entre o que é essencial e o que é fundamental”.

 Assim sendo, para iniciar este ano podemos relacionar o que seria fundamental em nossas vidas, como, por exemplo, uma boa casa para morar, um meio de transporte, uma renda estável, boa escola para os filhos, viagens e lazer com a família, e tantas outras coisas consideradas fundamentais para viver a vida. Agora temos que responder a pergunta: e o que é essencial na sua vida?

A palavra essencial é um adjetivo de dois gêneros que qualifica algo ou alguém que é de fundamental importância, que tem um valor significativo, que é vital, imprescindível. Talvez com essa definição, encontrada facilmente em qualquer dicionário da Língua Portuguesa, possamos compreender melhor a questão.

Por certo já conseguimos entender que um carro novo pode ser fundamental, mas que sua saúde ou de algum membro de sua família é essencial. Aquela viagem do sonho é fundamental, mas o abraço e carinho da mamãe é essencial. A reforma da casa é fundamental, mas o pão nosso de cada dia e a família reunida em volta da mesa é essencial. Uma boa poupança é fundamental, mas o sorriso de gratidão daquele desconhecido que você ajuda sem querer nada em troca é essencial. Realizar a bonita festa de aniversário da esposa é fundamental, mas ouvir ela falar eu te amo é essencial. Enfim, existem coisas fundamentais e outras essenciais sem as quais a vida não faz o menor sentido.

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Imagens de nossa história

Posto de vendas da Superintendência da Borracha 
Assis Brasil/Acre 1983. (foto: acervo Jerry Correia)

O ciclo da borracha foi um momento da história econômica e social do Brasil, relacionado com a extração de látex da seringueira e comercialização da borracha. Teve o seu centro na região amazônica, e proporcionou expansão da colonização, atração de riqueza, transformações culturais e sociais, e grande impulso ao crescimento de Manaus, Porto Velho e Belém, até hoje capitais e maiores centros de seus respectivos estados, Amazonas, Rondônia e Pará. No mesmo período, foi criado o Território Federal do Acre, atual Estado do Acre, cuja área foi adquirida da Bolívia, por meio da compra no valor de 2 milhões de libras esterlinas, em 1903. O ciclo da borracha viveu seu auge entre 1879 e 1912, tendo depois experimentado uma sobrevida entre 1942 e 1945, durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Quando o Bela Vista ficou embaixo d'água


Fevereiro de 2012. As águas do Rio Acre transbordaram e atingiram boa parte da cidade de Assis Brasil. O bairro mais afetado foi o Bela Vista onde quase 200 famílias foram expulsas de suas casas pela cheia histórica.




terça-feira, 25 de julho de 2017

Juarez e o Boi Mimoso


Lá vem Juarez e o Boi Mimoso desfilando pela avenida
A carroça tá pesada, mas o Mimoso é cheio de vida.

A areia vem de graça das praias do velho Rio
Foi Deus quem abençoou esse bem que nos serviu.

O sombreiro na cabeça e a muxinga preparada
Mimoso não apanha, é só pra fazer zuada.

Vai gritando Juarez e Mimoso obedecendo
Mais uma carrada de areia e uma casinha aparecendo.

Obrigado velho amigo Juarez pelo trabalho que prestou
Também ao Boi Mimoso por tantas carroças que puxou.


(Jerry Correia)

Saudosas lembranças

Chegada de Assis Brasil.



Desfile de 7 de setembro.

Soldado Joatan que participou da 2 Guerra Mundial.

Soldado Joatan.

Moradores da Vila Assis Brasil.

Desfile aniversário da cidade.

Construção da Ponte Binacional.

Professora Tereza Cristina.

Pioneiro João José do Bomfim.

Bar Selva de Pedras.

Travesia do Rio Acre.


Primeira fanfarra de Assis Brasil.

Antiga Praça José Guiomard dos Santos.


Antigo centro de Assis Brasil.


Avenida Raimundo Chaar.
Antigo restaurante Barriga Cheia.

Desfile de 7 de setembro.

Antiga marcenaria municipal.

Beneficiadora de madeira da prefeitura.

Antiga Biblioteca Astrogilda Bomfim Bezerra.


Superintendência da Borracha.


Time de futebol "Resto do Mundo".









domingo, 23 de julho de 2017

A Estrada da Vida



Não há uma estrada real para a felicidade, mas sim caminhos diferentes. Há quem seja feliz sem coisa nenhuma, enquanto outros são infelizes possuindo tudo.
Luigi Pirandello


Histórias e causos do Icuriã

Itaan Arruda

O que vai ser relatado aconteceu pelas bandas do Icuriã. Faz tempo, ó. Foi uma época esquisita. Dizem que a comunidade estava muito populosa. Gente demais. Era preciso organização. Tudo estava complicado: faltava água; esgoto passando na frente dos casebres; escola com professor semi-analfabeto; sem uma benzedeira decente para sarar feridas e aliviar encostos. Até um crime aconteceu, com promessa de revanche por parte da família do Pinté. Ninguém esperava por Governo que, até aquele momento, poucas vezes tinha aparecido por lá. Para espanto de alguns que ironizavam. “Aqui é tão espatifado que, mesmo sem Governo, a gente não consegue dar ordem às coisas”. Ao que alguém sentenciou. “Era preciso organização”, lembra um dos primeiros “governadores” do local, o líder Antônio Calça Curta em entrevista a uma jovem historiadora. “Era preciso fazer política”.
Mas, fazer política sem Governo, pra quê? Isso lá tem sentido? O governo estava ausente da Vila Icuriã. A essas indagações, Calça Curta respondia como quem honra o bigode que não tinha. “Eu quero cuidar desse povo”, prometia. “Ponho minha vida nisso”. De fato, Antônio Calça Curta melhorou a vida de muitos. Não de todos, que não está aqui se falando de um deus. Mas, a vida melhorou. Era fato.
Mandou buscar canos do quartel do Exército na Vila Assis Brasil e botou água limpa dentro; criou uma canalização para jogar esgoto longe das cabaceiras do rio. Até um boticário mandou trazer da capital.
“Pra evitar ‘barriga’ em menino novo”. Antônio Calça Curta conquistou o povo do Icuriã. Veio até um retratista da capital acompanhado de um doutor das letras para fazer reportagem esticada-elogio-sa no periódico oficial. Era um novo fenômeno: moço, bem apessoado, sorriso fácil, trato gentil. Mas, contrariasse o diabo do homem que os beiços vinham pelas canelas. Era um lundum horrível. “Eu tinha que ser daquele jeito”, recorda Calça Curta, agora já velho. “Se não fosse do meu jeito, seria do jeito de quem? Ali na vila, depois de mim só tinha bicho e mato. Alguém tinha que decidir as coisas. E eu decidi que tinha que ser eu”, disse, quase em tom de saudade.
Com a popularidade de Calça Curta em alta, uma esquisitice começou a acontecer na região. De repente, os desafetos naturais que um homem opinioso constrói ao longo da vida desapareceram. Tudo no vilarejo passou a ter uma tranquilidade incomum. O “governador” da Vila Icuriã passou a contar com uma cordialidade consensual. Não havia embate.
A política praticada por Calça Curta era a política do consenso. Tudo tinha que ser por consenso. Ou era unanimidade, ou não valia. De uma hora para outra, a Vila do Icuriã ficou conhecida como a “referência regional”. A Vila era “modelo para isso”; “modelo praquilo”. Calça Curta se justifica para a estudante. “Mas, minha filha, não éramos nós quem falávamos. Eram os homens do governo que a partir daquele momento, não saiam de lá”.
De alegria em alegria, a Vila Icuriã foi definhando. Descobriu-se que as mudanças implantadas por Calça Curta endividaram de tal monta a comunidade que não havia dinheiro que pagasse. Muita gente começou a fugir subindo os descendo o rio. Em menos de um mês, quase a Vila se transforma em um lugar fantasma. Uma tristeza medonha se enraizou. Só Calça Curta ficou por lá. Buscou guarita em Assis Brasil depois que um grupo de peruanos saqueou o que restava de valor. Orgulhoso, Calça Curta deu um muxoxo subindo o barranco. “Gente ingrata. Não sabe reconhecer quem sempre deu a vida por esse lugar”.

Povo Jaminawá


Texto: Fátima Ferreira - Fotos: Jerry Correia
Na região do médio rio Ucayali, no Peru, habitavam vários grupos da família lingüística Pano. Lá estavam os Xixinawá (gente do quati), Kununawá (gente da orelha-de-pau), Sharanawá, Yawanawá (gente do queixada), Mastanawá (gente do socado), Bashonawa (gente da mucura), Sharanawá (gente povo bom) e Yawanawá (gente do queixada). Esses grupos, que eram conhecidos como grandes guerreiros, realizavam expedições para guerrearem entre si e com outros grupos da região.


Com a chegada dos caucheiros peruanos tiveram o primeiro contato com a sociedade branca, obrigando a formarem um só grupo com a denominação de Jaminawá, e assim dificultando ou mesmo em alguns momentos tornando impossível a convivência, pois as diferenças eram grandes, deixando uma característica marcante que é a divergência interna. Com a circulação de ferramentas de metal, as redes interétnicas de intercambio e a provável disseminação de vírus como o da varíola, provocando epidemias, levaram à morte inúmeras pessoas e até mesmo povos.


Com toda essa pressão o povo Jaminawá foi empurrado para o Juruá, alguns se engajando nas atividades de caucheiro e outros fugindo do contato, onde mais tarde realizaram uma enorme migração para o Moa (o não afluente do Juruá), mas um outro menor, do rio Yaco e outra entre os rios Yaco, Purus e Tahuamanu.



De lá um grupo de mais de cem Jaminawá debilitados por repetidas epidemias se instala no seringal Petrópolis. Informes da FUNAI descrevem uma situação de desorganização do grupo e exploração econômica. É estabelecido nesse ano um posto indígena, quebrando o monopólio do seringal. Com esse apoio, os Jaminawá se instalam rio acima, na área Mamoadate, que congrega duas aldeias Jaminawá (Betel e Jatobá) e uma Manchineri (Extrema). 


Primeiramente recrutados para trabalhar em seringais sob domínio do patrão Estevão Meirelles, e mais tarde tornando-se caçadores para o comércio de pele de animais silvestres, já com o patrão Cariolano. Trabalharam ainda de mateiros florestais, servindo aos patrões nas aberturas de estradas de seringa e varadouros de escoamento de produtos e também como extratores de seringa e caucho. Sempre mantiveram a agricultura de subsistência, servindo até de mão-de-obra nos grandes roçados dos patrões. Exerciam também a função de remadores e varejadores nos barcos dos senhores dos barracões.


Anos depois mudaram para o seringal Senegal, de onde saíram para a cabeceira do rio Acre, onde já se encontrava morando um grupo de Jaminawá, na época liderado por José Correia, formando a aldeia Ananaia, que se tornou a principal daquela terra indígena.


Essa perambulação deixa claro uma característica marcante desse povo, que é o seminomadismo, revelado nas freqüentes mudanças, e as dispersões de famílias, quase sempre motivadas pelas divergências internas.

No verão, época das praias, costumam realizar passeios para visitarem seus parentes distantes, sem pressa de retornar. Conta-se também o fator cultural, quando da morte de um membro da família nuclear mudam-se a fim de afastar as lembranças do falecido.


A liderança antigamente era um grande caçador, provedor incomum, que tinha o dom da oratória, mantinha várias mulheres, além de ter o poder da persuasão na comunidade, mediando conflitos internos e externos e não temendo forças ocultas. Para isso conhecia as regras de sua tradição. Também não temia tomar o shori (ayahuaska), que para eles é um remédio. Acreditam que tomar shori traz saúde ao corpo, mas podem também aplicar o bagaço do cipó sob as partes doentes do corpo. O shori também tem um lado lúdico, que permite ver ou viajar. Essas sessões são organizadas pelo koshuit (pajé), uma espécie de doutor, que detém o poder sobre a vida.

A economia é baseada principalmente no cultivo da macaxeira e banana, na caça e na pesca. Cada família nuclear possui seu roçado, se tornando economicamente autônoma, mas não exclui relações de reciprocidade entre as unidades familiares, pois a carne e o peixe são distribuídos para toda a comunidade.


A cultura material passa por uma revitalização, onde a cerâmica, a tecelagem e a cestaria têm sido os artesanatos mais enfatizados. A arte oral e musical Jaminawá é muito rica, com belos cantos xamânicos conhecidos por poucos. Homens e mulheres têm seus cantos, que descrevem os sentimentos do autor e as peripécias de sua vida.

Desde de 1990, o povo Jaminawá vem passando por um estado de crise. Um fator complexo de difícil explicação até mesmo para os próprios Jaminawá, resultando na vinda de famílias inteiras para as periferias das cidades, principalmente da capital. A realidade da cidade logo se apresenta como uma competição diária para garantir a sobrevivência, fazendo com que passem a viver um tempo diferente e difícil. 


Atualmente rumam em direção a uma reestruturação social, política e cultural, processo desencadeado pela necessidade de fazer uma reflexão sobre sua situação. Na assembléia realizada em meados no ano de 2001, reuniram-se todas as comunidades Jaminawá, resultando na criação da Organização das Comunidades Agro-Extrativistas Jaminawá (OCAEJ).